FREGUESIA DE S. MIGUEL DO MATO



O Rancho Folclórico de Vilar de S. Miguel do Mato tem como objectivo a recolha, preservação e divulgação da Cultura Popular da freguesia e de toda a região envolvente. Se este objectivo tem vindo a ser alcançado, não é menos verdade que o nosso Rancho tem levado, condignamente, o nome da nossa freguesia a quase todas as regiões do país. Com o nome da freguesia vai, também, o nome do nosso concelho e da nossa região.

Queremos ir mais longe e pretendemos que todos os S. Micaelenses, espalhados pelo mundo, continuem a ter orgulho da sua terra e da sua região. Para isso, entendemos ser necessário criar um elo de ligação à sua terra natal. Assim, estamos convencidos que a melhor maneira de o fazer é tentar elaborar um pequeno resumo histórico da freguesia. Não vai ser tarefa fácil. Escrever sobre o presente não será tão difícil, mas sobre o passado o problema vai ser mais complicado. Assim sendo, apelamos aos nossos conterrâneos, que têm possibilidades de colaborar, para o fazerem através do nosso email. Pela nossa parte, iremos consultar a Enciclopédia Luso-Brasileira, o Arquivo Distrital, o livro “VIDA DE UM CURA” de autoria do Padre António Costa, natural de Vilar e irmão do saudoso fundador do nosso rancho folclórico, Sr. Armando Costa, outras fontes escritas e ouvir o testemunho das pessoas mais idosas da nossa freguesia. Toda a ajuda é bem-vinda: Textos, artigos, fotos antigas, etc. Sabemos que um trabalho desta natureza nunca está fechado; todos os dias podem aparecer novas achegas.

O trabalho irá ter dois capítulos:

S. Miguel do Mato hoje

S. Miguel do Mato ontem







S. MIGUEL DO MATO HOJE

Freguesia de S. MIGUEL DO MATO
Concelho de VOUZELA
Distrito de VISEU
Região de LAFÕES
Província BEIRA-ALTA

Área – 9 Km2
Habitantes (censos de 2001) - 1128
Fogos - 554
Eleitores (31-12-09) - 1067

Altitude – 514m de máxima e 250 de mínima
Distâncias – 13 km de Vouzela
14 km de Viseu

CONSTITUIÇÃO (de Sul para Norte):

Caria
Vilar
Vila Pouca
Rabaçal
Malurdo
Cruzeiro
Roda
Casal
Adsinjo
Moçâmedes
Burgetas
Capela
Lourosa da Comenda (Nogueira, Arrabalde, Outeiro e Prado)

ÓRGÃOS AUTÁRQUICOS SAÍDOS DA ELEIÇÕES DE 11-10-2009

JUNTA DE FREGUESIA :

Presidente – Fernando dos Santos Marques
Secretário – José Marques
Tesoureiro – Francisco Fernando Rodrigues Barros

ASSEMBLEIA DE FREGUESIA :

Presidente – Fernando Serpa dos Santos
1ª Secretária – Zita Maria Almeida Lima Cabral
2º Secretário – Custódio Gastão Pinheiro Rodrigues
Manuel Maia Pereira dos Santos
Carla Daniela Mendes Barros
Joaquim António Magalhães Perpétuo Correia
António Gonçalves de Almeida
Gilberto Marques do Carmo
Ana Sofia da Silva Pinto Margarido Lopes

Sede da Junta de Freguesia – Antiga estação da CP

POSTOS DE ENSINO :

Escola do 1º Ciclo de Caria
Escola do 1º Ciclo de Moçâmedes

Jardim de Infância de Moçâmedes

ASSOCIAÇÕES CULTURAIS, DESPORTIVAS E SOCIAIS EM ACTIVIDADE :

Associação Cultural e Recreativa de Vilar – Rancho Folclórico
Associação Social, Cultural e Desportiva de S. Miguel do Mato – Apoio Domiciliário
Sociedade Musical de Moçâmedes – Banda de Músic
a




S. MIGUEL DO MATO ONTEM

Antes de começarmos a abordar a história antiga da Freguesia de S. Miguel do Mato, queremos chamar a atenção dos nossos amigos para algumas questões que podem vir a complementar e ajudar a compreender o nosso trabalho. Em primeiro lugar, e como já foi dito, este trabalho nunca estará fechado, antes pelo contrário, estará aberto a todos aqueles que quiserem colaborar. Depois, temos que ter em conta que, na antiguidade, o território, que é hoje a freguesia, era servido por duas Estradas Romanas. Uma saía de Viseu, passava junto a Vilar (onde existe, ainda, um troço), atravessava Caria, passava por Vouzela e Águeda a caminho de Aveiro. O povo apelidou-a de Estrada da Sardinha porque era através dela que o peixe do mar de Aveiro chegava à região de Viseu. A segunda via saía de Viseu, passava a Sul do território, sem nele entrar, na direcção de S. Pedro do Sul e a caminho do Porto. Estas duas estradas viriam a ter grande importância no desenrolar histórico da nossa região. Queremos, também, chamar a vossa atenção para o facto de ser vulgar a confusão entre freguesia e paróquia. Embora os territórios quase sempre coincidam, a freguesia tem administração civil, enquanto a paróquia tem cariz religioso. Por fim, vamos começar por transcrever uma lenda (será que é?)que, em tempos, ouvimos a algumas pessoas de idade que já nos deixaram.

COMO E QUANDO APARECEU A FREGUESIA DE S. MIGUEL DO MATO?

Segundo a lenda, onde Caria acaba e Vilar começa, ao lado da Estrada da Sardinha, está a Capela do Espírito Santo, que dizem ser a mais antiga da região. Esta capela era o centro religioso de uma grande área territorial. Com o tempo e o consequente aumento populacional, este território deu origem a três paróquias: S. Miguel do Mato, S. Miguel de Queirã e S. Miguel de Bodiosa. Hoje, só o nome de S. Miguel do Mato se mantém, contudo, as paróquias de Queirã e de Bodiosa têm, também, S. Miguel como orago. Durante muitos anos, as Ladainhas das três freguesias convergiam para a capela de Espírito Santo. Passada oralmente de geração em geração, é possível que esta “lenda” tenha qualquer coisa de verdade.

Fizemos consultas nas fontes já acima citadas (principalmente na Enciclopédia Luso-Brasileira) e vamos tentar organizar um resumo dos factos históricos que consideramos serem mais relevantes da história da freguesia. Assim, o território que constitui a nossa freguesia foi habitado, há milhares de anos, por povos primitivos. Eram pessoas que viviam em cavernas e caçavam animais de pequeno e médio porte nas serras circundantes. Sucederam-se as invasões de povos estranhos e, mais tarde, nestas paragens, por onde teria andado Viriato e seus guerreiros, fixaram-se povos de civilizações mais avançadas. Entre eles, destacamos, pela influência que tiveram no desenvolvimento local, os Romanos e os Árabes. Contudo, a verdadeira história da nossa terra começa com a fundação do Reino de Portugal. É natural que a maior parte das povoações que constituem a freguesia já existissem antes do aparecimento de D. Afonso Henriques. É o caso de Vilar e Caria que apareceram, possivelmente, com a Estrada Romana que ligava Viseu a Aveiro. Caria e Moçâmedes são nomes de origem arábica, o que nos faz pensar que a sua fundação remonta ao tempo da ocupação árabe. Certo, certo, sabemos que nos finais do séc. XII a freguesia já estava constituída e era formada pelas seguintes povoações: Caria, Lourosa, Moçâmedes, Roda, Vila Pouca, Vila Gaga e Vilar. De Vila Gaga só resta o nome de uma zona para os lados do Loural.

Não há dúvida que estas terras foram pertença de pessoas ilustres, que, através dos séculos, deram um enorme contributo para o desenvolvimento da região e do país. As mais destacadas estiveram ligadas a Moçâmedes e é sobre elas que nos vamos debruçar. Sabe-se que nos primeiros anos do séc. X governava o território, mais ou menos correspondente à Beira-Alta, o príncipe D. Ramiro que tinha residência em Viseu e em Moçâmedes. Nesta localidade, no ano de 928, encontrava-se o citado príncipe acompanhado pela sua comitiva. Foi de Moçâmedes que, poucos anos depois, D. Ramiro e a sua gente partiram para o Reino de Leão, onde cingiu a coroa e passou a ser D. Raimundo II de Leão. Mais tarde, o ainda Infante D. Afonso Henriques doa a Fernão Peres a “villa” de Moçâmedes, estávamos em Maio de 1133. Esta doação foi feita por carta entregue pessoalmente pelo futuro primeiro rei de Portugal a Fernão Peres, em Paredes. Anos após, e já no reinado de D. Fernando, era Senhor de Moçâmedes e do restante território de Lafões o Conde D. Henrique Manuel de Vilhena, tio do monarca.

Entretanto, acontece a crise da Guerra da Independência, 1383-1385, e o Conde D. Henrique Manuel de Vilhena toma o partido de Castela. Na sequência, o Mestre de Avis retira-lhe todas as possessões e entrega-as, por carta de 21-5-1384, ao grande patriota Martim Vasques da Cunha. Este, mais tarde, estando de passagem por Oliveira de Frades, fez, com a sua mulher, a doação de Moçâmedes ao escudeiro Gonçalo Pires de Almeida que havia casado com uma Senhora viúva de nome Inês Anes. Este casamento, como muitas vezes acontecia, foi feito por mandado do casal doador. Acontece que Inês Anes foi ama do grande Infante D. Henrique o que leva a pensar que Moçâmedes tivesse tido a honra de ter abrigado, algumas vezes, o Infante Navegador. Tudo leva a crer que isso tenha acontecido, pois a pouca distância que separa Moçâmedes da então famosa Vila do Banho seria motivo para umas férias do jovem Príncipe em terras de S. Miguel do Mato. Este casal teve um filho que veio a ser o novo Senhor das terras de Moçâmedes. Chamava-se João de Almeida e dizem os documentos da época que era colaço (irmão de leite) do ilustre Infante D. Henrique. João de Almeida teve bastantes problemas para se firmar como Senhor de Moçâmedes, problemas esses provenientes da doação que, anos antes, o então patriota Martim Vasques da Cunha tinha feito em nome de seus pais. Acontece, como já vimos, que as terras de Moçâmedes tinham sido retiradas, pelo Mestre de Avis, ao conde D. Henrique Manuel de Vilhena, por este ser partidário do rei de Castela, e as tinha doado a Martim Vasques da Cunha. Este, algum tempo mais tarde, toma, também, o partido de Castela e, por isso, a posse do Senhorio de Moçâmedes é posta em causa, tendo em conta a doação a que já nos referimos. Teve João de Almeida de pedir ajuda a um seu familiar, de nome Martim Lourenço de Almeida, vassalo do rei, que consegue que o monarca D. João I confirme, para sempre, a posse do Senhorio de Moçâmedes a João de Almeida, por carta dada em Viseu, em 30-1-1410. João de Almeida teve um filho, a quem deram o mesmo nome, que viria a ser fidalgo da casa do Infante D. Henrique. A este novo João de Almeida é confirmada pelo rei D. Duarte a posse do Senhorio de Moçâmedes, por carta dada em Almeirim, em 9-1-1434. O mesmo fará D Afonso V, por carta dada em Sintra, a 2-9-1450. João de Almeida não teve residência oficial em Moçâmedes. Viria a suceder-lhe o seu filho Luís de Almeida que vê a confirmação da posse do Senhorio de Moçâmedes ser-lhe feita por carta de D. Afonso V, entregue em Viseu, a 8-11-1454. Luís de Almeida morre e o mesmo monarca, em carta datada de Maio de 1462, entrega o Senhorio de Moçâmedes a Fernão de Almeida.

Em Novembro de 1475, já era Senhor de Moçâmedes o heróico Decepado da batalha de Toro, o famoso Alferes D. Duarte de Almeida. Acontece, porém, que a posse do Senhorio de Moçâmedes andava a ser disputada. Por carta de D. Afonso V, a 29 de Novembro de 1475, é garantida a D. Duarte de Almeida e a seu filho maior, por sua morte, outra terra tão boa como a de Moçâmedes, se esta lhe vier a ser retirada. Isto veio a acontecer, provavelmente, em 1485, porque, em 24 de Janeiro de 1486, foi dada a D. Duarte de Almeida uma coutada em Portel pela terra de Moçâmedes.

Vamos parar um pouco na evolução cronológica dos Senhores de Moçâmedes (só nos referimos aos que consideramos mais importantes) para nos debruçarmos sobre um facto que não deve ter passado despercebido aos nossos leitores. Ao falarmos do 4º Senhor de Moçâmedes, Luís de Almeida, dissemos que, à sua morte, o rei tinha doado a posse de Moçâmedes a Fernando de Almeida, filho de Diogo Fernandes de Almeida. Acontece que Luís de Almeida tinha um filho com o mesmo nome. Sendo assim, qual a razão que levou o rei a doar o Senhorio de Moçâmedes a uma pessoa que nada tinha a ver com o seu Senhor? A explicação é simples: Dizem-nos documentos antigos que o referido Luís de Almeida casou com Florença Rodrigues Beleaga que o assassinou com peçonha (veneno ou doença venérea), ficando grávida. Ninguém queria acreditar que o filho fosse de Luís de Almeida. Depois de várias diligências feitas junto do rei D. Manuel I, vem este a confirmar o Senhorio de Moçâmedes a Luís de Almeida (filho), por carta dada em Lisboa, a 30 de Janeiro de 1500. O mesmo viria a ser feito por D. João III, a 28 de Dezembro de 1532, em Évora. O seu sucessor foi Luís de Almeida (oterceiro com este nome) , tendo-lhe sido confirmado o Senhorio de Moçâmedes em 20-7-1549. A partir de agora, o Senhorio de Moçâmedes foi passando regularmente aos seus herdeiros.

Em 13 de Agosto de 1779, José de Almeida e Vasconcelos do Soveralde Carvalho da Maia Soares de Albergaria, filho de Luís de Almeida Vasconcelos, 14º Senhor de Moçâmedes, foi feito Barão de Moçâmedes e, a 8 de Novembro de 1805, elevado a Visconde da Lapa. O seu sucessor, seu filho, José Maria Manuel de Almeida e Vasconcelos, 15º Senhor e 2º
Barão de Moçâmedes, morreu em 1796, solteiro, sem geração. Sucedeu-lhe o seu irmão, Manuel de Almeida e Vasconcelos Soveral de Carvalho da Maia Soares de Albergaria, 16º Senhor e 3 º Barão de Moçâmedes e Visconde da Lapa. Foi feito Conde da Lapa, em 31 de Agosto de 1822. Distinguiu-se como diplomata. Nasceu em Luanda, no dia 2 de Outubro de 1784 e morreu a 28 de Junho de 1832. O seu filho único, Manuel Francisco das Misericórdias de Almeida e Vasconcelos do Soveral de Carvalho da Maia Soares de Albergaria, sucede-lhe e passa a ser o 17º Senhor e 4º Barão de Moçâmedes e 2º Conde da Lapa. Morreu em 17 de Novembro de 1898. O seu 2º filho varão, José de Almeida e Vasconcelos, é feito visconde e, depois, conde de Moçâmedes.

Voltamos a falar no 1º Barão de Moçâmedes, José de Almeida e Vasconcelos do Soveral de Carvalho da Maia Soares de Albergaria, pois é ele que liga, para sempre, Moçâmedes a Angola. Foi Coronel de Cavalaria, Governador de Goiás (Brasil) e Governador e Capitão-General de Angola. Assumiu o governo de Angola em 1784 e, em 1785, ordena as expedições de exploração e ocupação da costa Sul do território, que estava a ser ameaçada por outras potências coloniais. A primeira expedição, composta pela fragata Luanda e pelo “Paquete Real”, largou de Luanda, no dia 25 de Maio de 1785, que era comandada pelo Tenente-Coronel Pinheiro Furtado. Em 22 de Junho, chega a expedição ao porto de Benguela, onde o comandante encontra vários problemas que teve de resolver, o que o obriga a perder algum tempo. Entretanto, a fragata Luanda, comandada pelo piloto Manuel José da Silveira, parte à frente e chega à baía de Angra dos Negros, no dia 3 de Agosto. Passado algum tempo, junta-se-lhe o resto da expedição. A viagem não correu muito bem, houve várias escaramuças e perderam-se alguns homens. Pinheiro Furtado, em homenagem ao Governador de Angola, muda o nome de Angra dos Negros para Baía de Moçâmedes. Foi criado um posto comercial que se veio a tornar numa das mais belas e progressivas cidades de Angola, a cidade de Moçâmedes. Após a independência de Angola, a cidade de Moçâmedes passou a denominar-se Namibe. Com ou sem mudança de nome, a história não vai deixar esquecer a ligação de Moçâmedes de S. Miguel do Mato à cidade angolana de Moçâmedes (Namibe).

E, assim, chegámos ao séc. XX, o século das grandes guerras e da República. Com as guerras vem um enorme surto de desenvolvimento para a nossa freguesia, onde se explorou intensamente o volfrâmio e o estanho. A sua história fica para outra ocasião ou para algum dos nossos amigos que a queira abordar.

Vamos terminar, por agora, fazendo referência à Igreja de S. Miguel do Mato, à Capela do Nosso Senhor da Agonia e aos pastéis de Vouzela.

IGREJA DE S. MIGUEL DO MATO

Não encontrámos muito sobre a Igreja Velha da freguesia. Diz-nos a lenda, testemunho oral passado de geração em geração, que umas senhoras idosas de Vila Pouca, por não terem herdeiros, doaram os terrenos de S. Miguel do Mato com a condição de lá ser construído um local de culto. É a segunda vez que, neste escrito, invocamos a tradição oral, a quem apelidamos de lenda. O Povo quase sempre tem razão. Se a não tem toda, normalmente tem alguma. Por isso mesmo, acreditamos que haja algo de verdade nesta história. A primeira referência escrita, que encontrámos, consta das Inquirições de 1258, séc.XIII, e conta-nos uma história engraçada que vou tentar resumir: perante os inquiridores, um jurado disse que o padroado (direito de protector adquirido por quem fundava uma Igreja) da Igreja de S. Miguel do Mato era dos cavaleiros fidalgos de Sirgueiros e dos paroquianos; outro jurado, Martinho Pequeno de Lourosa, depôs que a Igreja está na herdade do rei e que os homens de Lourosa, Moçâmedes e Vila Pouca, terras do rei, sempre a “apresentaram”. O mesmo jurado denunciou aos inquiridores que o pároco da Igreja, Padre João Peres, lhe havia recomendado, da parte do Cónego de Viseu, Martins Anes, que não declarasse que a Igreja era do rei e que, ainda, pediu a outros homens para mentirem. Por conseguinte, a Igreja pertencia ao padroado real. Já no séc. XIX, e de acordo com a Estatística Paroquial de 1862, “era abadia de apresentação do bispo e do padroado real”. A Igreja, como é natural, sofreu várias obras de reparação e de ampliação que vieram a alterar a sua traça original. Entre outras, chamamos a atenção para a que consta na escritura de obrigação entre o reverendo Agostinho Nunes de Sousa Valente, cónego da Sé, e o pedreiro Manuel Pereira de Sousa, natural de Orgens, datada de 6 de Outubro de 1791. Nela, o referido pedreiro comprometia-se a compor a capela-mor da Igreja pela quantia de oitenta e cinco mil réis. Se observarmos bem o pouco que ainda resta da velha Igreja, verificamos alguns sinais da construção primitiva. Na parte exterior da que foi a zona do altar-mor existem vários cachorros muito parecidos com os existentes na Igreja Matriz de Vouzela. Será que eles nos querem dizer que a Igreja primitiva de S. Miguel do Mato é contemporânea da jóia arquitectónica de Vouzela?!

CAPELA DO NOSSO SENHOR DA AGONIA

Num local ermo, no cimo de um cabeço rochoso que se debruça sobre o vale cavado pelo rio Trouço, encontramos uma pequena capela em granito, construída entre enormes rochas, em louvor de Nosso Senhor da Agonia. O lugar é inóspito, como o seu próprio nome sugere: Frádega.

Como e quando foi construída, em tal lugar, a Capela do Senhor da Agonia?

Vamos servir-nos de um trabalho que nos foi facultado pelo Museu Municipal de Vouzela para, numa linguagem mais simples, fazermos um pequeno relato dos acontecimentos. Nesse trabalho são apontados, como fonte de pesquisa, a obra Vouzela, a Terra, Os Homens e a Alma e um texto inédito cedido pelo Sr. Fernando dos Santos Marques, Presidente da Junta de Freguesia.

O culto ao Senhor da Agonia surge em 1750, quando é encontrada uma Imagem de Cristo esculpida num pedestal de pedra. Sobre o aparecimento desta imagem, o abade da Igreja de S. Miguel do Mato, José Pereira Baptista, em 1818, conta o seguinte: “No dia 11 de Agosto de 1750, Maria Pereira, casada com Manuel Rodrigues dos Santos, que morava nas últimas casas de Moçâmedes para Sul, tinha mandado os seus filhos pequenos buscar lenha ao monte, onde avistaram o Senhor. Perante a demora dos filhos, ela saiu de casa para os procurar. Encontrou-os a brincar no sítio onde o Senhor apareceu. Ralhou-lhes, mandou-os apanhar lenha e sentou-se a fiar a sua roca sobre o penedo onde estava o Senhor. Passado algum tempo, olhou para baixo, por uns buracos entre penedos, onde estavam alguns fetos e reparou que eles abanavam como se fossem sacudidos por grande vendaval. Olhou para os buracos e para o céu, não havia vento. Continuou a fiar e, daí a pouco, o fuso caiu-lhe para os fetos que abanavam. Desceu e foi buscar o fuso, encontrando-o encostado a um braço do Senhor, que tinha o resto do corpo coberto de musgo. De imediato mandou chamar o Abade, que era António Ferreira Cardoso dos Cardosos de S. Pedro do Sul. Chegado ao local, examinou as lajes e mandou repicar os sinos. A notícia correu rapidamente pela região e comoveu imensa gente que, toda a noite, cobriu a montanha com muitas fogueiras e muita alegria. Durante anos, foram se juntando as esmolas com que o Sr. Abade fez a capela, como hoje se encontra”. (este texto foi composto)

A construção da capela não foi imediata ao acontecimento. Em 1758, foram chamados alguns pedreiros para comporem as pedras de maneira que o pedestal com o crucifixo ficasse mais exposto. O Pároco conta, ainda, que lhe mandou fazer um pequeno nicho aberto e com uma grade, “não tinha mais que 20 palmos em quadrado”. Anos mais tarde, a devoção do povo, materializada em esmolas, edificaria a Capela do Nosso Senhor da Agonia. Em 26 de Setembro de 1789, será concedida licença para a sua bênção.

Todos os anos, a 11 de Agosto, as portas da Capela abrem-se para a celebração da missa e o povo continua a aparecer com a mesma devoção e alegria de sempre. Actualmente, a realização da Festa está ao encargo dos habitantes de Lourosa da Comenda.

PASTÉIS DE VOUZELA

O jornal Comércio do Porto publicou, em 24 de Janeiro de 1992, um artigo assinado por José Calema que aborda a história do aparecimento dos pastéis de Vouzela. Porque tem interesse para a história da nossa freguesia, vamos fazer um pequeno resumo da parte que, realmente, nos interessa.

Nos meados do séc. XIX (+- 1850), uma criança, filha única de gente afidalgada e de muitos teres, natural de Moçâmedes, ficou órfã de pai e mãe e entregue à tutela do Padre Francisco que era homem ambicioso, de muitas querelas em tribunal e de nenhuns escrúpulos. Entregou a criança às suas nove irmãs solteironas, mas de muita virtude, para elas a criarem e educarem. Duas das irmãs do Padre Francisco foram freiras no Convento de Santa Clara do Porto e, quando o convento fechou, decidiram regressar à sua terra natal, Vouzela. São elas que vão ter a maior influência na educação da nossa pequena conterrânea. O Padre, talvez por ganância, arranja o casamento da sua tutelada com um brasileiro rico, tinha ela apenas 7 anos. Porque a menina não tinha corpo nem mente para o casamento, o marido, de nome João de Almeida Cardoso, deixou-a, por mais três anos, entregue aos cuidados das irmãs solteironas. Passado este tempo, o brasileiro, já com quase 50 anos de idade, levou a menina para sua casa e em pouco tempo encheu-a de filhos e desbaratou a fortuna que viera de Moçâmedes. À cadência de quase um filho por ano, é que, aos trinta e poucos anos, D. Maria de Jesus Queirós Liz Cardoso tinha à sua volta 14 filhos para alimentar e sem recursos para tal. Enviuvando nova, aproveita os ensinamentos recebidos das duas irmãs freiras e, com a ajuda financeira da senhora da Casa de Prazias (Ventosa), começa a fazer bolos e doces do imenso receituário do Convento de Santa Clara do Porto, que vende nas romarias da região e na estação da CP. E foi assim, desta forma invulgar, que apareceram, em Vouzela, os deliciosos folares e os famosos pastéis.

Como já referimos, este trabalho não está fechado. Porque nenhum de nós tem formação em história, é natural que haja algumas imprecisões, pelo que ficamos à espera das vossas achegas para as corrigir ou para complementar o trabalho


Vilar, 31/3/2010
O Rancho Folclórico de Vilar